segunda-feira, abril 14, 2014

Apresentação do Livro de Curso CR (1963-2013)

Por amabilidade do apresentador do nosso Livro de Curso (1963-2013), o CALM Dr. Rui Abreu, segue-se uma recensão, por si escrita, do que nos transmitiu no CMN em 26 de Março de 2014:


"No passado dia 26 de Março teve lugar no Clube Militar Naval a apresentação de mais um Livro de Curso, encerrando as comemorações dos 50 anos de entrada para a Escola Naval, em 2 de Setembro de 1963, do Curso Miguel Corte Real.
A frase acima de mais um Livro de Curso, não está, no caso presente inteiramente correcta. De facto este livro foge ao formato tradicional deste tipo de obras, em geral compostas por relatos de episódios e peripécias vividas na primeira pessoa, e como tal narradas, abrangendo quer o dia a dia escolar, quer as ocorrências mais significativas de viagens de instrução, e muitas vezes completadas com textos autobiográficos de percursos de vida, dentro e fora da Armada, de dimensão, conteudo e discurso forçosamente desiguais. Desiguais nas vivências e na sua descrição, com a subjectividade do olhar que a si próprio se contempla no espelho da memória. Desiguais na construção do texto, no brilho da escrita, na relevância da narrativa.
Este é um livro pequeno, com um design muito cuidado, paginação com iconografia muito rica e variando de tamanho, cor e temática ao longo dos suas noventa paginas, reproduzindo momentos, personalidades, documentos e paisagens, recordações colectivas ou individualizadas. Em papel couché de gramagem de luxo, sobre um fundo de página evocando motivos náuticos, este livro começa, mesmo que não tivesse nada escrito, por ser um maravilhoso álbum de fotografias, apelativo não só para os elementos do CR e seus familiares. Dizendo sempre mais a quem está ou passou pelas fileiras da Briosa, será também contemplado com agrado por quem não é nem nunca foi da casa… Resumindo: esteticamente muito bem conseguido.
Posto isto importa uma apreciação sobre o conteudo.
            Primeira constatação: os textos são da autoria de vários membros do curso, mas não estão assinados, reforçando a intenção de se entender este livro como sendo do Curso Miguel Corte Real. Começa por uma Nota de Abertura, com dignidade de um editorial de que transcrevo uns parágrafos: Livro de Cursos, mais apropriadamente será, marcos e caminhos percorridos, factos salientes ou de especial significado, simbolismo, intensidade, actos de peças que são vidas, imagens paradas de contínuos individuais que se entrecruzam e onde fomos figurantes principais. Mais adiante: Tal qual a rebentação que vai e vem, assim no percurso que aqui se recorda, estivemos ora mais próximos ora mais distantes, mas sempre ligados por essa condição única, imaterial, que se entranha em nós para sempre, de seremos do mesmo curso, irmanados no botão da âncora, na condição militar e pelo mar.
            Depois de uma apresentação nominal dos Cadetes do 1º ano do Curso Miguel Corte Real, segue-se uma cuidada biografia do patrono, com a indispensável referência à Pedra de Dighton, hoje musealizada, continuando polémica.
            Passa-se a uma análise da época, os gloriosos anos 60, com o título algo evangélico Naquele Tempo, em que são relembrados os acontecimentos mais relevantes, políticos, científicos, artísticos e do dia a dia. Da crise dos mísseis aos primeiros passos da informática; dos Beatles ao assassinato de Kennedy, da Apolo XI ao “mini”. Personalidades e pontos de viragem num mundo em evolução acelerada. Estende-se a interpretação histórica e sociológica ao nosso Pais. Como éramos, como nos fomos transformando. A emigração para a Europa. A natalidade, com famílias de 10 ou mais filhos, caminhando para a realidade dos nossos dias. O crescimento económico, a melhoria nos dados estatísticos da saúde e educação. O advento da segurança social. A guerra de África e o fim anunciado dum regime e da última parcela do Império euromundista. Abordam-se o evoluir tecnológico e organizacional da Marinha, desde o ensino aos novos meios. São evocados Comandantes, Professores e Instrutores da Escola Naval, os Cursos contemporâneos e os nomes mais sonantes dos cadetes RN que também passaram nessa altura pela mesma.
            Segue–se um dos aspectos mais imaginativos, escrito com verve q.b.: engenhosamente personifica num fictício cadete Miguel Corte Real as vivências escolares, os embarques de fim de semana, a praxe e os seus comodoros, o terrível enjoo dos primeiros dias de mar e as rabecadas dos oficiais de quarto, os cheiros e os ruidos a  bordo, o tipismo dos marujos mais antigos. O julgamento na passagem da linha e o impacto do uniforme, à porta do Pic – Nic, nas raparigas que passam. Os desportos e namoricos do cadete Corte Real desde a sua fase inicial de mancebo até ao Juramento de Bandeira e promoção a Guarda – Marinha. Termina o capítulo, intitulado “Como Foi” com dois epílogos em que, sexagenário e reformado, o Oficial Corte Real revê a sua vida na Marinha e volta à Escola Naval já a pensar nos netos…
            Relatam-se a seguir com pormenor as várias viagens de instrução e estágios, com um justificativo desenvolvimento, cheio de peripécias, da viagem do Curso ao Brasil. Passeios, recepções, paradas, bailes e pelo meio alguns afazeres mais penosos…vulgo pincéis. Amores e saudades. Exercício de desembarque, com madrugadas frias e dias quentes, muita sede e grande esfalfa. Memórias gratas para quem as viveu…
            Vamos encontrar, prosseguindo a leitura, um dos achados que tornam esta obra muito diferente de outras do mesmo género! Em vez das costumeiras pequenas autobiografias subscritas pelos diferentes elementos do curso, este optou por uma agenda! Agenda que como todas, começa no 1º dia de Janeiro e termina a 31 de Dezembro. E por cada dia, de diferentes anos, com início na primeira metade do Sec XX e tendo o último registo -  infelizmente um óbito – em 2013, vão sendo referidas efemérides relativas aos 76 camaradas do curso, desde as datas de nascimento dos próprios, ou dos filhos ou dos netos. Quando casaram, iniciaram comissões, assumiram Comandos ou Direcções. Ou fizeram o exame da 4ª classe, os prémios que ganharam no liceu, foram operados. Condecorações, licenciaturas que concluíram, livros que escreveram. Apenas factos. Dos que seguiram uma carreira naval, aos que partiram para outra…
            Termina a obra com as reportagens, bem suportadas por fotografias, das comemorações dos 25, 40 e 50 anos onde a nostalgia aumenta à medida que os uniformes vão diminuindo na tradicional fotografia de grupo.
            Sem referência a editor ou autores, presume-se que o livro seja obra colectiva, pensada, coligida, organizada e concretizada por uma Comissão de Curso que merece parabéns È um livro bonito, com textos, uns mais sérios outros mais leves mas de inigualável qualidade.
            Como todos os Livros de Curso tem como primeiros destinatários os elementos e famílias dos CR, mas pode perfeitamente ser lido ou folheado pelas visitas da casa de cada um…
            E não seria mal pensado que fosse lido por todo e qualquer candidato à Escola Naval. Traça um bom retrato do que era e o que viria a ser um Oficial de Marinha.
            Há que preservar a memória."

                                                                                                      Rui de Abreu



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